NOTAS SOBRE O HINO NACIONAL

O Hino Nacional foi composto por Francisco Manuel da Silva e Joaquim Osório Duque Estrada. O primeiro fez a música, uma marcha bem cadenciada que lembra A Marselhesa, hino nacional da França. O segundo escreveu a letra, dentro das regras tradicionais da poesia parnasiana, sempre na busca do verso perfeito.
Desse modo, um músico da corte imperial e um poeta parnasiano foram os responsáveis pela criação do Hino Nacional brasileiro.
O interessante é que os dois não se conheceram. Quando o poeta Osório Duque Estrada nasceu, em 1870, o músico Francisco Manuel já havia falecido há cinco anos.
Francisco Manuel da Silva era um professor de música na corte de Dom Pedro I e sacristão da capela imperial. Após a independência do Brasil, em 1822, compôs uma peça musical, no ritmo de marcha, em homenagem ao imperador, apresentando-a no Dia do Fico, em 1831. Uma música forte, altiva, que logo caiu no gosto popular. Mas, não se tornou o hino oficial e recebeu uma letra que bajulava exageradamente o imperador.
Com o fim do regime imperial e a proclamação da República, os militares fizeram um concurso, em 1890, para eleger um hino nacional. Receberam muitas críticas, por parte de intelectuais cariocas, que gostavam da antiga marcha do sacristão Francisco Manuel. Com isso, o marechal Deodoro da Fonseca, para não cancelar o concurso, transformou o resultado em Hino da República e o Brasil continuou sem um hino nacional.
Em 1906, na posse de Afonso Pena, alguém tocou a velha marcha de Francisco Manuel, em homenagem ao novo presidente. Afonso Pena gostou muito e abriu um concurso para selecionar a melhor letra em cima da melodia do sacristão do império. O vitorioso foi o poeta parnasiano Joaquim Osório Duque Estrada. Todavia, não se oficializou, na época, como hino nacional, porque o presidente Afonso Pena faleceu no mesmo ano do concurso, em 1909.
O Brasil continuava sem um hino oficial. Até que, em 1922, por ocasião do centenário da independência, os organizadores do evento resolveram, na pressa, buscar a antiga música de Francisco Manuel, agora com a letra de Osório Duque Estrada, oficializando, em definitivo, o Hino Nacional brasileiro.
O presidente da época, Epitácio Pessoa, tinha pressa porque queria inaugurar o rádio no Brasil e desejava que o Hino Nacional fosse cantado na primeira transmissão. Para se precaver, providenciou para que fosse devidamente quitada a compra da letra e o governo pagou 5 contos de réis a Osório Duque Estrada, poeta que fazia parte da Academia Brasileira de Letras.
A música agradou de imediato. Poucos sabiam que se tratava de uma melodia da época imperial. Tornou-se uma peça musical vigorosa e inconfundível. Bastam os acordes iniciais para ser reconhecida. Um hino imponente e triunfal, embora difícil de ser executado.
A letra do hino, porém, demorou anos para ser assimilada. O poeta Osório Duque Estrada era da corrente parnasiana e uma das características daquela escola era a inversão das frases poéticas.
Assim, para dizer que “as margens plácidas do Ipiranga ouviram o brado retumbante de um povo heróico”, o poeta escreveu: “Ouviram do Ipiranga as margens plácidas, de um povo heróico o brado retumbante”, trocando a ordem natural das frases.
Essa licenciosidade parnasiana continuou no restante do poema. Além disso, o parnasianismo era bastante romântico. Para dizer que a nação estava assentada em um enorme continente, o poeta escreveu trechos como “deitado eternamente em berço esplêndido”, “gigante pela própria natureza” e assim por diante.
Após a Revolução de 1930, Getúlio Vargas decretou que, o Hino Nacional somente poderia ser executado por orquestras ou bandas militares e em ocasiões cívicas muito especiais. Além disso, somente poderia ser tocado em fá maior, obedecendo a partitura original, no mesmo ritmo e velocidade tradicionais. Bastou para que o hino ficasse resguardado e defendido como um dos símbolos nacionais, tornando-se quase um patrimônio exclusivo do exército brasileiro.
Mais tarde, na esteira de movimentos anti-militaristas, o Hino Nacional foi sendo executado de forma mais livre e com maior frequência, principalmente em eventos cívicos escolares. O ápice se deu com o movimento das Diretas-Já, na década de 1980. Nele, artistas como Fafá de Belém e outros, ousaram cantar o Hino Nacional numa tonalidade diferente do fá maior, em ritmo bem mais vagaroso do que a composição oficial, com certeza, para irritar os velhos quartéis militares.
Hoje, o Hino Nacional, na prática, tem apresentação bem mais livre e é entoado até nos campos de futebol. Porém, tudo com muito respeito e concentração.
Em tese, as regras de execução continuam. Quando cantado, o Hino Nacional deve ser tocado em fá maior. Quando apresentado, de forma instrumental, a orquestra ou banda pode utilizar a nota básica do si bemol. É o máximo de licenciosidade permitida na sua execução.
Francisco Manuel da Silva, autor da música do Hino Nacional
Joaquim Osório Duque Estrada, autor da letra do Hino Nacional
Luís Estevam