A Congada em Pires do Rio por Sandra Inácio da Silva

São muitas as histórias relatadas sobre o surgimento da festa do Rosário no Brasil, mas estima-se que, advenha das práticas das congadas vindas da África e, atualmente, “derivam de costumes, crenças, relações e representações sociais de povos africanos” (BRANDÃO, 1987, p. 192). Assim, a origem da Congada de Pires do Rio provém de lendas e histórias contadas com diferenciadas interpretações, o que valoriza cada participante dos festejos, ou seja, demonstra a mistura de diferentes culturas.

Em relação ao surgimento da Congada piresina, a senhora Maria José da Costa, por exemplo, disse que, quando começou a fazer parte da Congada conheceu o senhor Antônio Severino, vindo de Minas Gerais, o qual aprendeu lá e trouxe o congo para Pires do Rio. Em sua lembrança busca a origem da Congada, se apropriando de outras memórias, ou seja, não vivenciou a vinda dos pioneiros. O senhor Paulo, acrescenta que, a Congada veio na segunda metade do século XX de outras regiões para Pires do Rio, a partir de 1958. Afirma ainda que, seu Nicolau Gonçalves Filho, devoto da Senhora do Rosário e rei dos Congos na década de 1980 junto com dona Josefina Cândida, vieram de Oliveira-MG, passaram por um tempo em Urutaí, e depois mudaram para o município piresino. Os primeiros ensaios, segundo ele, foram realizados debaixo de folhas de bacuri, cujo primeiro festeiro foi seu Herculano Garcia.

Sendo assim, em outubro de 1962, Nicolau Gonçalves Filho, fundador da Festa de Nossa Senhora do Rosário, juntamente com Joaquim Duque (ambos ferroviários) realizaram a 1ª festa dos congos em Pires do Rio. Começava-se a formar os primeiros ternos de Congada, chegando a ter o número de oito. Percebese que, a origem da festa dos Congos em Pires do Rio parece estar relacionada à Congada do estado de Minas Gerais. Segundo Silva (2001, p. 44), “em Minas Gerais, de onde muitas festas e costumes foram trazidos para Goiás, Nossa Senhora do Rosário foi e ainda é bastante cultuada”.

A Congada em Pires do Rio, desde seu início, foi se transformando por meio da junção de pessoas de outras regiões. Com isso, os integrantes foram alterando elementos da tradição e a dinâmica própria da festa. Em 1968, houve mudanças no congado piresino. Paes (1989) esclarece que, “Em 1968, devido à interferência de elementos da comunidade (políticos) houve uma dicotomia entre os ternos de congo piresinos. Ficando de um lado o Rei Celestino tendo como rainha Maria Francisca Abadia, apoiados pelos padres Franciscanos de Pires do Rio e, do outro lado, ficaram o Rei Joaquim Duque e a Rainha Silvéria (sua esposa) apoiados pela Igreja Católica Brasileira da cidade de Goiandira”. (PAES, 1989, p. 147).

A partir da separação entre os ternos de Pires do Rio, o grupo do Rei Celestino auxiliado por políticos piresinos construiu outra igreja em 1970: a Capela de Nossa Senhora do Rosário, na Rua Michel Santinone, 65, no Bairro Santa Cecília. No entanto, o Rei Joaquim Duque permaneceu na antiga Capela de Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e Santa Efigênia, localizada na antiga Rua do Cruzeiro, no mesmo bairro. Esta foi fundada em 1966 e erguida num terreno doado por Antônio Rodrigues, morador de Pires do Rio, devoto de Nossa Senhora do Rosário. Sua construção só foi possível devido ao esforço de todos os membros da irmandade e doações para construção da capela.

Durante dez anos, as festividades piresinas foram realizadas nas duas capelas, devido aos conflitos dos grupos. No entanto, esta divisão permaneceu até a morte do Rei Celestino, na década de 1980.

“Com a morte do Rei Celestino e mudanças ocorridas no meio eclesiástico de Pires do Rio, os grupos se uniram novamente realizando uma única festa, cujo rei ficou sendo Joaquim Duque. Os congueiros não se adaptaram à igreja nova (embora mais confortável) e a festa continuou sendo realizada na antiga capelinha”. (PAES, 1989, p. 147).

Percebemos que, as divisões dentro da Congada não deram certo, tanto é que os ternos se uniram novamente. Até o ano de 1989, os ternos de Pires do Rio eram compostos por 30 integrantes, mas já contaram com 130 componentes, divididos em grupos denominados Moçambique e Congos, distribuídos hierarquicamente de acordo com o posto que ocupem: rei; rainha; general; capitão-mor; 1°e 2° capitão; 1º e 2º sargento; cabo e soldado. Esta era a forma original dos ternos piresinos se apresentarem na festa do Rosário.

Na pesquisa, observamos o deslocamento da Congada de Pires do Rio para diferentes locais da cidade. Na fala do senhor Paulo nota-se essa realidade:”Então ela foi uma festa que migrou para diversos pontos da cidade. (…). A festa teve os seus altos e baixos, né? O primeiro local que se relata era realizada próximo ao bar do seu falecido seu Divino Machado na antiga Rua Soledade. Por ali teve os primeiros manifestos no Bairro Santa Cecília. Posteriormente, depois alguém da família do Zé Abdala foi festeiro e esta festa foi para o Colégio Sagrado Coração de Jesus, no centro. Passando alguns anos voltando mais ou menos para aqueles redutos onde teve seu início. Sempre ela foi uma festa mais do bairro Santa Cecília”. (Paulo Cesar Sampaio. Entrevista. Pires do Rio, junho, 2015).

E, por fim, no ano de 2014, por determinação do Corpo de Bombeiros, foi transferida novamente para outro espaço: o Bairro Tancredo Neves por ter ruas largas, mais espaço, longe das moradias, tendo maior segurança em caso de acidente. Está próxima ao Batalhão do Corpo de Bombeiros e ao lado do parque Agropecuário. O importante é observar que, a festa sempre ficou voltada para o bairro de seu início, porque é ali que fica a Capela Nossa Senhora do Rosário e o Salão do Rosário, construídos especialmente para a realização da festa. Sobre estas mudanças, o senhor Paulo se diz a favor de mudanças, desde que a festa não acabe.

A senhora Maria das Dores (nome fictício) fala da transferência de local e da importância da Congada. Esta depoente é membro da comunidade piresina e moradora de uma das ruas, onde era realizado o festejo até o ano de 2013. Relatamos, com tristeza, sobre a mudança e diz que, sendo idosa, já com 70 anos, não consegue ir aonde a festa é realizada. Para ela, a Congada faz parte do seu bairro, pois a movimentação das barraquinhas e dos congadeiros alegravam o ambiente, ressaltando que, “eles não deveriam ter tirado a festa daqui. Eles deveriam saber nossa opinião antes de mudar para lá. Pois tem mais de 45 anos que faz neste bairro: o Santa Cecília” (Maria das Dores. Entrevista, Pires do Rio, junho, 2015). Apreende-se que, a transferência não foi aceita somente pela comunidade, mas também pelos que participaram desta festividade.

A senhora Rosângela M. (nome fictício) moradora do mesmo bairro, também não concordou com a transferência, porque a primeira festa da Congada foi realizada ao lado de sua residência, onde tudo começou e, segundo ela, todos naquele bairro já estavam acostumados com o movimento da festa. “Nesta rua era a explosão da Congada, aqui é onde tudo começou, na antiga Rua do Fogo. Nossa festa está acabando, era aqui, agora já passou lá para o outro lado da cidade” (Rosângela M. Entrevista. Pires do Rio, junho, 2015). É perceptível na fala dos entrevistados a indignação pela mudança do local da festa, haja vista ser uma tradição por mais de 53 anos no mesmo bairro, o que de certa forma, essa transferência de espaço demonstra o descaso com a memória dos moradores e dos componentes da festa.

A Congada, em Pires do Rio, acontece no mês de outubro, porém não tem data específica para ser realizada, pois seu início depende do término da festa do Rosário de Catalão, pois tanto os congadeiros catalanos, quanto os barraqueiros participam das festividades no município piresino. “Por isso sua ocorrência oscila entre dia 9 e 25 de outubro sendo sua duração de 10 dias consecutivos” (PAES, 1989, p. 143).

A Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, foi fundada em Pires do Rio no dia 1º de outubro de 1962, a Irmandade atuou até 14 de setembro de 1966 com estatutos provisórios, só então teve o seu estatuto oficializado segundo fls. 90 V 91, sob o n. 235 do livro B-4 do Cartório do 2º Oficio da cidade de Pires do Rio. (PAES, 1989, p. 150).

A partir deste período até os dias atuais, a festa de Nossa Senhora do Rosário tornou-se uma tradição em Pires do Rio. Está inserida dentre as festas mais tradicionais da cidade, as quais atraem indivíduos de várias partes do país: São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Urutaí, Orizona, Palmelo, Goiandira, Catalão, dentre outros.

FONTE: SILVA, Sandra Inácio da. The Congada in Pires do Rio and Catalão: a cultural manifestation.. 2016. 114 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Humanas e da Terra) – Pontifícia Universidade Católica de Goiás, GOIÂNIA, 2016.

 

 

O Blog da Maysa Abrão esteve presente na Festa de Nossa Senhora do Rosário de 2018. Confira todos as fotos e vídeos nos links abaixo:

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