O CATIREIRO NA NOSSA HISTÓRIA

No período da colonização da região de Catalão, da mesma forma que no Triângulo Mineiro e no Alto Paranaíba, era grande o isolamento da população, provocado pelas grandes distâncias e as dificuldades de locomoção daqueles tempos. Os bancos também eram raros, fator que inibia a circulação de moeda corrente, exigindo, muitas vezes, a realização de negócios por meio de permutas, como a melhor opção para girar a economia.
Esse fato, certamente, foi o responsável pelo surgimento da cultura do Catireiro, um típico personagem da região, um comerciante geralmente informal, especializado nos negócios feitos por meio de trocas de mercadorias, o escambo, popularmente conhecido como catira, gambira, barganha, permuta etc, feitos com ou sem a participação de dinheiro.
O nome catira tem origem tupi e se refere a uma dança muito apreciada por tropeiros e tocadores de boiadas. Certamente, dar o nome da dança a esse negócio é uma forma de atrair alguém para uma boa conversa, que não deixa de ser um jogo.
O desenvolvimento dessa forma de negociação acabou incorporando-a à cultura de boa parte da população regional, principalmente nas transações envolvendo a pecuária, a suinocultura, os equinos, aves, os produtos agrícolas, mantimentos e equipamentos.
Por viver em um ambiente dependente das variações climáticas e das flutuações do mercado, ambas alheias ao seu controle, o produtor rural necessita ser naturalmente astuto. E caminhar nessa corda bamba sempre foi a sina do Catireiro, de olho no mercado, na sazonalidade de cada produto e nas condições do tempo.
Alem desse conhecimento, um bom Catireiro deve cultuar os traquejos e artimanhas da arte de negociar, técnicas que, até hoje, pouco se ensina nas escolas. Portanto, a observação e a prática são essenciais a um Catireiro. E é preciso ter foco (o que se quer vender e por quanto, além de saber exatamente o que se precisa comprar, por qual custo), ser criativo e ter disposição para ir atrás dos negócios. Afinal, cobra que não anda não come sapo, como diz o povo.
No embate de uma negociação, ganha pontos aqueles mais sagazes no conhecimento da alma humana, observadores mais perspicazes das fraquezas, das urgências e das dificuldades do outro. Situações às vezes doloridas, mas que fazem parte desse jogo. Explorador, velhaco e outros sinônimos similares muitas vezes são ditos sobre eles. Mas negocia quem quer. E o Catireiro, por ser um incentivador de negócios, é um importante agente econômico.
Um bom Catireiro deve saber controlar seus negócios, conferindo com atenção as entregas e os recebimentos dos bens negociados. Ou da volta combinada. O que não se admite é um mal negócio, um prejuízo, levar uma manta, sofrer uma ré: é imperdoável! Um cavalo barato pode ser parcialmente cego e o touro pode estar capado. E, pior, o cheque pode estar sem fundos!
Em Catalão todos nós conhecemos grandes catireiros, alguns deles incorporados ao folclore local. E muitos dos nossos comerciantes juntaram aos costumes locais a grande habilidade árabe nos negócios. Vários Catireiros fizeram ou mantiveram fortunas, mas nem sempre. E o comércio formal acabou por adequar-se às práticas da catira, muitas vezes necessárias à manutenção dos negócios ou ao recebimento de débitos.
Mesmo contando hoje com tantos recursos tecnológicos e mercadológicos para o acompanhamento dos precos e o fechamento de negócios, o espírito da catira ainda permeia a nossa cultura, nos mais diversos tipos de operações comerciais.
Olho vivo, porque cavalo não desce escada!

 

FOTO: Verificando a idade do cavalo

FOTO: Avaliação de grãos

Por Paulo Hummel Jr