Hoje decidi trocar a caminhada de todos os dias por uma “andada” por minha cidade, que já bocejava na brisa fresca e céu limpinho! A gente não vê e não vive, quando só anda de carro.
Voltei pra casa 1 hora e meia depois, com a certeza de que, por mais que viaje o mundo, é aqui que quero viver.
Apesar de todos os problemas, trânsito, violência, buracos, mandos e desmandos...tenho orgulho de viver aqui!
A vida não é feita do agora – tenho no coração uma colcha de retalhos (que hoje chamam de patchwork), que começou a ser costurada muito antes do paralelepípedo. Como dizia Neruda “Ainda chove dentro de mim, como há 60 anos em Temuco”.
E assim é que mirei...
A história do Hospital São Nicolau começa em 1968, com início das obras do complexo. Uma iniciativa empreendedora do médico Dr. William Safatle, com o apoio do Dr. Paulo de Tarso Salviano e Naim Safatle.
Percebendo o desenvolvimento da cidade, que aumentava sua população e demandava cada vez mais por serviços de saúde, a necessidade da medicina especializada foi o marco para a realização e conclusão do projeto em 10 de Agosto de 1974.
Em primeiro plano, na foto abaixo, o saudoso doutor Willian.
No dia seguinte, orei no túmulo do apóstolo e assisti à missa dedicada aos peregrinos. É uma pomposa cerimônia, com um belo sermão e o famoso espetáculo do botafumeiro, enorme incensório, usado para a queima de incenso, prática que, na antiguidade, tinha o objetivo de neutralizar o odor pouco agradável exalado pelos peregrinos... Preso a um cabo pendurado no teto, ele é balançado durante alguns minutos.
Mas, hoje, na missa dedicada aos peregrinos, eles são raros, se comparados aos turistas. Recriminei-me, mas não consegui conter o desapontamento.
Circulei por Santiago e, às 16h, tomei um ônibus com destino...
Falar da chegada é muito mais que descrever o último trecho da caminhada, em tudo similar às demais etapas na Galícia. Desde que saí de Santa Irene, fui tomado por um entusiasmo fora do comum, uma grande plenitude, uma autoconfiança que me fazia sentir capacidade de mudar não somente a minha vida, mas o próprio mundo. Caminhei firme, alegre, satisfeito. Várias vezes me peguei a cantar ou chorar de alegria. Nem a subida da serra que antecede o aeroporto ou o interminável sobe-e-desce antes do Monte do Gozo, chegaram a abalar-me. Achei-as suaves, não sei se pelo entusiasmo ou se, realmente, não exigiam grande esforço.
Bem cedo, tomamos o café-da-manhã no próprio albergue e mergulhamos mais uma vez na neblina, com as inevitáveis pausas para Joan fazer seus desenhos. Eu, Joan, Marlies e Stefani seguimos até Palas de Rei, uma cidade de tamanho médio, aonde chegamos por volta de meio-dia. Os demais membros do grupo resolveram almoçar ali, enquanto decidi seguir em frente, pois estava sem fome.
Ainda que se possa dizer que a falta de apetite era verdadeira, acho que ela foi provocada mais pelo meu desejo de rever Dolores, uma linda loira espanhola. Tinha cerca de 30 anos de idade, e eu a conhecera em um bar, em...
Fizemos uma merenda em Portomarín e seguimos em frente. Aliás, a palavra merenda, comum no Brasil até poucas décadas atrás – é mantida em pleno uso pelos espanhóis (“merienda”). É bem mais apropriada que o vocábulo lanche, cujo uso alastrou-se pelo Brasil, copiado da palavra “lunch”, que significa almoço, em inglês. Substituímos a merenda pelo almoço.
A uns 5 km adiante, depois de enfrentar um longo trecho em aclive acentuado, na saída de Portomarím, alcançamos Gonzar, um pequenino povoado, onde resolvemos pernoitar.
Ali não havia nenhum comércio, à exceção do bar vizinho ao refúgio, que somente servia “bocadillos”. O albergue...
Em Barbadelo conheci Marlene, uma jovem integrante de um grupo composto de várias famílias alemãs. Tinha uns 20 anos, linda e loira, mas não falava espanhol, fato que restringiu o nosso diálogo. Impressionou-me a simplicidade e a praticidade dos alemães. Com o albergue lotado, acomodaram-se, tranquilamente, na sala e nos corredores, sem perder o bom-humor.
Lá conheci também Marlies, outra bonita loira alemã, de uns 23 anos, que estava só e iniciava ali o seu Caminho. Muito alegre, meiga e simpática, falava espanhol e dizia gostar de caipirinha. Vivia em Barcelona, onde fazia um curso de extensão em arquitetura, já em fase de conclusão. Eu, Joan e ela jantamos juntos, com...
Foi na Sierra del Real, montanha próxima ao Cebreiro, a primeira vez que vi peregrinos a cavalo. Passaram esguios e rápidos, orgulhosos de seus animais, demonstrando pouquíssima identificação com os caminhantes. Sequer dispensaram-me um Buen Camino. Claro, isso não significa que fazer a peregrinação a cavalo não seja bom ou válido. Mas é uma experiência peculiar.
Somente em Tricastela, já na Galícia, pude conversar um pouco com os peregrinos de botas, que também lá se hospedavam, num grupo de seis cavaleiros. O albergue da localidade dispunha de área de pastagem, própria para recebê-los, particularidade que ainda não conhecera. Esse fato levou-me a crer que eles percorrem rotas distintas das utilizadas pelos...
Enquanto percorria as trilhas da montanha, surpreso, vi um idoso casal preparando o solo para o cultivo, num platô da serra, com o auxílio de antiquados arados, puxados por bois. Encontrar, na Europa, aquela prática medieval era uma coisa que eu nunca poderia imaginar, não obstante seja ainda comum nas regiões mais pobres do Brasil. Viviam isolados no pequeno pueblo próximo à lavoura, onde parece que o tempo parou, impedindo o seu progresso.
Após o platô, descendo a serra por uma encosta com forte declive, a trilha retornou ao vale. Durante a descida, quase fui surpreendido por um grupo de ciclistas que trafegava em disparada...
Ainda na subida da serra, detive-me também sobre os conflitos interpessoais, muitas vezes decorrentes de uma equivocada visão das relações:
Se identifico nos outros somente o que também tenho, por que tanto me preocupam os defeitos dos demais?
Tenho poucos amigos ou não sou amistoso?
Afastam-se de mim ou os espanto?
Conspiram contra mim ou sou inseguro?
São infiéis ou os marginalizados?
Compartilho ou escondo?
Isolam-me ou os isolo?